segunda-feira, 14 de junho de 2010

A História da TSR


Bom pessoal já que foi abordado o assunto RPG oldschool na postangem dos homens lagartos, nada melhor que contar a história da TSR que se confunde com a história do D&D e do RPG, vale a pena ler. Abraços
 
A história da TSR se confunde com a história do próprio hobby. Além de publicar o primeiro e mais importante RPG do mundo, Dungeons & Dragons, foi a primeira a ter sucesso e alcançar um grande público, sendo essencial para a difusão dos RPG’s ao redor do mundo. Nessa série de artigos, contarei a história da TSR de sua criação até a sua aquisição pela Wizards of the Coast. Não entrarei em muitos detalhes sobre os jogos produzidos. Em outras oportunidades, farei artigos sobre todas as edições de D&D até a 2E e também sobre outros jogos publicados pela editora.

•    Tactical Studies Rules

A primeira “encarnação” da TSR foi a Tactical Studies Rules, criada por Gary Gygax e Don Kaye em Outubro de 1973 para publicarem um novo jogo chamado The Fantasy Game. Gygax tinha oferecido o jogo para a Avalon Hill Games, que rejeitou a oferta. Eles não tinham interesse em um jogo sem “vencedores e derrotados”. Para criar a empresa, Gygax e Kaye juntaram 2400 dólares. Cada um deles tinha 50% da empresa. Notem que Dave Arneson, co-criador do D&D, ficou de fora da sociedade.
Logo da Tactical Studies Rules: o "G" de Gygax e o "K" de Kaye

No entanto, o primeiro produto publicado pela Tactical foi um jogo de miniaturas chamado Cavaliers and Roundheads, que se passa na Guerra Civil Inglesa (século XVII). Segundo Gary, ele foi feito apenas para gerar receita para a produção de D&D. No entanto, não foi o suficiente. A vontade de Kaye e Gygax era publicar o jogo (agora chamado de Dungeons & Dragons) imediatamente. Assim, em 1974, Brian Blume foi admitido na empresa como uma parte igual (agora, cada um dos donos tem 33%), em troca de investir capital na produção de D&D.
Capa de Cavaliers and Roundheads

A primeira edição foi produzida, com impressão inicial de 1000 volumes. Todos eles embalados à mão por Gary (no porão de sua casa) e seus parceiros. A primeira venda ocorreu no fim de Janeiro de 1974, para um jogador. Em Setembro, os 1000 volumes já tinham sido todos vendidos. A Tactical trabalhava com venda direta para os jogadores, através dos correios; algumas poucas lojas de wargames encomendavam 25, 30 edições. O jogo era vendido a 10 dólares, mais um conjunto de dados por 3,50. Em Outubro/1974, foi produzida a segunda impressão de 2000 volumes, esgotada em Maio. Com a divulgação boca-a-boca de D&D ao redor dos Estados Unidos, a Tactical Studies Rules começava a crescer: Tim Kask foi contratado para ser o Editor de Publicações, sendo o primeiro empregado da empresa.
No entanto, vítima de um ataque do coração, Don Kaye morre em 1975. Problemas com a esposa de Kaye (segundo Gary, era impossível trabalhar com ela) dão um fim à parceria, que é refeita por Blume e Gygax.

Após a morte de Don Kaye e os problemas com sua esposa, Gary e Brian dissolvem a Tactical Studies Rules e criam uma nova empresa, a TSR Hobbies, Inc. Para a “reforma” da empresa, Gygax foi forçado a vender uma grande fração de sua parte na empresa para Brian Blume e seu pai, Melvin. Agora, Gary era dono de 35% da empresa. Mais tarde, por insistência de Brian, Kevin começou a controlar a parte de Melvin na empresa. Em pouco tempo, fazia parte do quadro de diretores da empresa.
Empire of the Petal Throne foi o primeiro produto lançado pela TSR Hobbies. Em seguida vieram dois suplementos para D&D: Greyhawk e Blackmoor. Ainda em 75 foram lançados também o boardgame Dungeon! e o RPG de velho-oeste Boot Hill (falarei dele aqui no blog). Nos anos seguintes, muita coisa foi produzida, como os suplementos  III e IV de D&D, a primeira versão do Basic D&D e a primeira edição de Advanced Dungeons & Dragons. Falarei sobre a maioria deles mais tarde, então não entrarei em detalhes sobre o quê exatamente estava sendo produzido na época. Em 1976 foi realizada a primeira edição da feira de jogos Gen Con.

O importante era que a TSR estava em grande crescimento. Em 1978, a empresa saiu do porão da casa de Gygax e fixou-se na Dungeon Hobby Shop, em Lake Geneva. Uma revista especializada listou-os em 1981 como uma das cem empresas que cresciam mais rapidamente nos EUA. Em 82, a empresa atingiu a marca de 20 milhões de produtos vendidos, além de ver seus produtos traduzidos em mais de 20 línguas. No entanto, a situação no interior da TSR não era nada boa.

Gary Gygax em uma convenção, por volta de 1979

Gygax relata que por volta de 79, deu algumas instruções a funcionários. Brian Blume, ao saber disso, disse para quem quisesse ouvir que “Não me importo com o que Gary disse. Tudo será feito da maneira que eu quiser!”. Nos anos seguintes, Brian aumentou seu controle sobre a empresa. Segundo Gary, a razão para isso era o dinheiro, já que todo o reconhecimento ia para Gygax. Isso pode ter “escurecido” a mente dos irmãos.
Durante esse período, a TSR Hobbies tentou diversificar suas atividades, produzindo miniaturas (que antes eram produzidas por outras empresas, com licença da TSR), action figures e outros produtos (saiu até um livro para colorir de D&D). Em 1982, Gygax foi mandado à California, mais precisamente à Hollywood em nome da TSR Entertainment, Inc, uma divisão criada para tratar de adaptações cinematográficas e para a TV de D&D. Gary não queria ir, mas com apenas 30% da empresa em seu controle, não podia discutir as ordens de Brian Blume. Aparentemente um fracasso, essa divisão só conseguiu uma única licença, a de um desenho animado chamado Dungeons & Dragons, que foi um sucesso absoluto, inclusive aqui no Brasil, onde foi exibido (e reprisado umas duzentas vezes) como Caverna do Dragão. Esse desenho ajudou a popularizar o RPG e a quebrar alguns preconceitos da sociedade, principalmente após casos com o de James Egbert III. Além da TSR Entertainment, outras divisões como a TSR Ventures e a TSR International foram criadas. A TSR Hobbies mudou seu nome para TSR, Inc. apenas.

Ainda sobre o James Egbert III, o que aconteceu foi o seguinte: no dia 15 de Agosto de 1979, James desapareceu em alguns túneis da universidade onde estudava, a Michigan State, enquanto supostamente “jogava” RPG (ou porque ficou doido por causa do mesmo). Foi quando o D&D começou a atrair a atenção da grande (e sensacionalista) mídia, que taxaram o jogo como “do demônio” (nada muito diferente do que ocorreu no Brasil há uns anos atrás). Uma associação chamada “Incomodados pelo Dungeons & Dragons” foi criada e um filme tosquíssimo com Tom Hanks chamado Mazes & Monsters foi feito. Gygax começou a receber ameaças de morte e teve até que contratar um guarda-costas. Livros de D&D foram queimados em fogueiras. Mas toda essa mídia acabou por ser boa, aumentando bastante as vendas do jogo.
Quando Gary Gygax voltou da Costa Oeste americana, encontrou sua empresa devendo cerca de 1,5 milhões de dólares. Os irmãos Blume haviam comprados cerca de 70 carros através de leasing, além de terem gastado uma fortuna em móveis e computadores que não eram usados e muitas vezes permaneciam em suas caixas. Havia cerca de trezentos funcionários contratados, sendo que apenas duzentos eram necessários. Muitos destes eram parentes dos Blume. Além disso, Brian havia imprimido alguns livros em grandes quantidades, fazendo um encalhe de milhões de exemplares.
Para tentar reverter esse quadro, foi votada a saída da família Blume da empresa. Gygax contatou Lorraine Williams, irmã de um escritor que conhecera na Califórnia e que tinha experiência administrativa. Segundo Ernest, trazê-la foi o pior erro de sua vida. A chegada de Williams significou para Gary a perda do resto de “poder” que ainda tinha na empresa. Williams comprou a parte dos Blume na empresa (dizem que os irmãos fizeram isso por retaliação, já que Gary tinha articulado sua saída do grupo). Gygax tentou cancelar a manobra, taxando-a como ilegal, mas não obteve êxito.
Logo usado pela TSR entre 1978 e 1980
Logo usado pela TSR entre 1980 e 1982

•    A Saída de Gary Gygax
Lorraine Williams assumiu a empresa com a premissa de transformá-la em lucrativa de novo. Segundo Gygax, Williams era eficiente na parte administrativa, deixando com que se focasse mais na parte criativa. Mas algumas coisas deixaram-no preocupado: primeiramente Williams se achava superior aos jogadores (!). Depois, foi verificado que ela tinha aumentado seu salário anual 10 mil dólares. Gygax queria tirá-la da direção imediatamente, mas foi aconselhado a esperar. Foi nesse momento que foi concretizada a compra das partes da empresa que pertenciam aos Blume por Lorraine Williams. Conforme dito anteriormente, Gary entrou na justiça para impedir tudo isso, mas não obteve êxito. Ainda havia a possibilidade de recorrer da decisão dos tribunais, mas os advogados cobraram uma grande quantia. Gygax, em um período de “turbulência mental” (conforme descrito por ele mesmo), cansado dos tribunais e da empresa, resolveu abandoná-la para sempre.

Gary Gygax em seu escritório

Gygax vendeu sua parte para Lorraine Williams em 31 de Dezembro de 1985. Antes de deixar a empresa, lançou dois romances para Greyhawk.
Logo após sua saída, Gygax trabalhou para a New Infinities Productions, Inc., onde lançou seu primeiro RPG “pós-TSR”, Cyborg Commando (de ficção-científica) e Dangerous Journeys (e acabou sendo processado pela TSR por isso).

•    A Administração de Lorraine Williams
Lorraine via o potencial de recuperação da empresa e achava que era bem possível transformá-la em lucrativa novamente. No entanto, por se achar melhor que os jogadores (ela nunca tinha jogado Dungeons & Dragons), simplesmente proibiu jogos dentro da empresa (!!). Dessa forma, vários produtos foram lançados sem nenhum playtest (!!!), causando discordâncias entre algumas regras. Alguns ainda conseguiram um teste “clandestino”. Mas Williams não era totalmente ruim: um funcionário que tinha uma esposa doente foi mantido na folha de pagamento por vários anos, mesmo quando faltava ao trabalho para cuidar de sua mulher. Obviamente que algumas boas ações não consertavam seus erros referentes aos jogos, carro-chefe da empresa.

Lorraine Williams (sim, é ela)

Durante seu “reinado”, a TSR expandiu sua linha de produtos, com livros, histórias em quadrinhos e revistas. Foi criada uma filial da empresa na costa oeste americana, para a produção dos mais variados produtos. O romance “Legacy” de R.A. Salvatore chegou às listas dos mais vendidos do New York Times, e a Gen Con bateu o recorde de público, com mais de 18.000 pessoas. A linha de produtos “alternativa” dava, nesse período, muito mais lucro que a linha “principal”, de jogos. A TSR chegou a lucrar 1 milhão de dólares por ano, empregando cerca de 400 funcionários.
No início dos anos 90, devido ao sucesso dos jogos de cartas colecionáveis (como Magic), foram lançados jogos como Dragon Dice e Spellfire (esse chegou a sair no Brasil), ambos sem muito sucesso. Foi também nessa época o início do fim para a empresa.

•    O Fim
Ao longo dos anos 90, foram lançados seis novos cenários de campanha pela TSR: Al-Qadim, Birthright, Council of Wyrms, Dark Sun, Planescape e Ravenloft, totalizando onze cenários produzidos. Tamanha variedade fragmentou o mercado, fazendo com que seus produtos competissem entre si. Os jogadores não acompanhavam o ritmo dos lançamentos e não tinham dinheiro para comprar todos os (caros) boxed sets. Isso também favoreceu o surgimento dos “fanboys”, que se recusavam a comprar qualquer coisa que não fosse do seu cenário favorito. O jogador de Forgotten Realms se tornou um jogador completamente diferente do jogador de Dark Sun, e assim por diante.  Alguns produtos, como os de Planescape, eram vendidos por preços mais baixos do que o valor necessário para produzí-lo. Além da enxurrada de cenários de campanha, ouve uma enxurrada de romances e produtos relacionados, resultando em um encalhe de mais de 1 milhão de livros. Também durante esse período, foi adotada pela TSR uma postura agressiva em relação aos materiais criados por fãs, gerando revolta na comunidade. Bill Slavicsek, que era funcionário da TSR na época, disse que a empresa era uma “completa bagunça”. Segundo ele, não havia a menor preocupação em se fazer uma pesquisa de mercado e saber o que o consumidor queria.
Em 1995, numa tentativa desesperada de se salvar, a TSR tentou vender licenças individuais de seus cenários de campanha para empresas de videogame. A Interplay adquiriu os direitos de Forgotten Realms e Planescape, a Acclaim os de Ravelonft e a Sierra os de Birthright. Nenhuma das empresas obteve grande sucesso com os seus jogos, frustrando a TSR que pretendia lucrar com o dinheiro das vendas.
Em 1996, a TSR acumulava 30 milhões de dólares em dívidas. Só se salvou da falência iminente porque foi comprada em Maio de 1997 pela Wizards of the Coast, a produtora do card game Magic (Lorraine Williams deixou a indústria de jogos e saiu do país). A própria Wizards, em 2002, foi comprada pela Hasbro, Inc. Também em 2002, a Gen Con foi vendida para Peter Adkinson, e as revistas Dungeon e Dragon foram vendidas para a Paizo Publishing.


Logo da TSR usado entre 1982 e 1991


Logo da TSR usado entre 1992 e 1999

Matéria retirada do blog: RPG Oldschool

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